Aliar o esporte à educação como uma poderosa ferramenta de transformação social tem sido a aposta de uma turma de esportistas que decidiu oferecer a crianças e adolescentes das periferias do Rio de Janeiro e Niterói oportunidades para um futuro melhor. Ao fazer parte dessas iniciativa, os jovens se tornam mais confiantes, melhoram o desempenho escolar e, o mais importante, passam a acreditar que são capazes de realizar os próprios sonhos.
Uma das ações nasceu em Nova Iguaçu, na Baixada Fluminense, pelas mãos do ex-jogador de vôlei de praia, Carlão Silva. Do Centro de Treinamento, batizado por ele de “Praia da Baixada”, já saíram atletas que hoje estão em grandes clubes ou até mesmo ganhando a vida em quadras internacionais. Há uma década e meia, o idealizador do projeto utiliza o esporte para afas
tar os jovens das drogas e da violência, numa das regiões mais carentes do estado. “Há 12 anos comprei um retroprojetor e fui para as escolas dar palestras sobre a importância do esporte. É gratificante ver que, após esses encontros, os jovens saem da zona de conforto e se descobrem como atletas ou profissionais do meio esportivo”, diz Carlão, que busca aplicar um massivo trabalho de conscientização.
João Lucas Marques Correa, de 18 anos, é um dos jovens que tiveram suas histórias ligadas ao Centro de Treinamento de Vôlei de Praia. Aos 13 começou a treinar e já passou por dois grandes clubes cariocas. Este ano foi convocado para a seleção brasileira sub 21 de vôlei de praia e, após muita dedicação e entrega, sente que está cada vez mais perto do seu sonho. “Foi uma benção, eu fui pego de surpresa”, disse.
Atualmente cursa Tecnologia da Informação, pela conquista de uma bolsa ao jogar pela instituição, e tenta conciliar os estudos com as quadras. “Quando comecei a jogar por clube foi muito cansativo, tinha que acordar muito cedo e dormia muito tarde. Ir de Comendador Soares até a Zona Sul de noite para jogar e voltar tarde de ônibus, era muito sacrificante. Mas graças ao vôlei, consegui bolsa por jogar pela escola”, contou João. Caminho semelhante percorreu a atleta Maria Clara Gomes. Iniciou aos 13 anos e não demorou para conquistar uma vaga nas seletivas sub 21 de vôlei de praia. Atualmente, está federada por dois clubes e ganhou uma bolsa de estudos por defender sua escola nas competições.
Outro projeto que também tem grande alcance e reconhecimento é a Associação Clarke, com sede no Estádio Caio Martins, em Niterói. Também de forma totalmente gratuita, funciona há mais de 10 anos prestando serviços à comunidade na área esportiva, educacional e cultural. O início das aulas foi a partir da junção de voluntários para oferecer seu tempo e ofício de forma social, sem custo e sem discriminação de classe, cor ou sexo. Atualmente possuem um pré-vestibular social, jiu-jítsu, muay thai, defesa pessoal, capoeira, judô, atendimento psicológico, fisioterapeuta, nutricionista entre outras atividades.
Philip Clarke, presidente da associação, explica que o projeto tem por objetivo levar essa oportunidade para quem não tem acesso. “Nosso propósito é usar as atividades como chamariz para poder trabalhar valores como amor, respeito, disciplina, hierarquia, honra, dentre outros em cada modalidade”, disse ele. E ainda contou: “Já tivemos nesse tempo de vida dezenas de alunos aprovados em vestibulares, campeões internacionais, e também muitos pacientes atendidos”.
Exemplos de sucesso
Ludimila Guimarães Moysés, de 27 anos, e Willer Briane Ribeiro, de 26, são algumas das joias que a associação adquiriu durante o tempo. Ludimila conheceu a iniciativa por acaso. “Fui ao Caio Martins para me inscrever no judô e não havia mais vaga, apenas para o jiu-jitsu, resolvi tentar um esporte novo.”, falou. Há quase dois anos ficou desempregada e não estava conseguindo se inserir no mercado de trabalho, o que começou a atingi-la emocionalmente. Com a possibilidade de estar sofrendo crises de ansiedade, foi orientada a iniciar alguma atividade física. “Depois que eu comecei a fazer jiu-jitsu, melhorei meu condicionamento emocional, mental e físico. Realmente funcionou como uma válvula de escape”, disse ela.
William, ou Will, como é chamado pelos companheiros, está na casa há cinco anos.Ele também teve a sua trajetória modificada pelo jiu-jitsu. “O projeto mudou a minha vida, já que mente vazia para adolescente é sempre oficina para coisas erradas. Até quando não tinha dinheiro de passagem o professor me ajudava para eu conseguir treinar.”, lembrou o jovem. Para ele, é indescritível a importância da sua participação, pois lá consegue superar todas as barreiras impostas na sua rotina. “No jiu-jitsu me encontrei. Por meio do esporte posso fazer tudo o que quiser”, diz confiante. Para o mestre Philip Clarke, a disciplina é essencial na formação não só do atleta, mas também do cidadão. “Enquanto o esporte, educação e cultura ocuparem o tempo de nossas crianças não haverá espaço paras crimes, drogas nem violência”, enfatiza.