“Cinco, seis, sete oito!” Pompons, laços de cabeça extravagantes e gritos de guerra. Quando pensamos em cheerleading, ou melhor, “líderes de torcida”, a imaginação nos leva diretamente para a construção hollywoodiana: meninas em uniformes de saia rodada que passeiam pelos corredores do ensino médio e ficam no sideshow de esportes maiores, servindo apenas para empolgar a torcida.
Entretanto, o cheerleading é uma modalidade esportiva reconhecida desde 2012 pela SportAccord, organização que reúne aproximadamente 100 federações internacionais de esportes. No âmbito das Olimpíadas, foi em 2016 que o Comitê Olímpico Internacional reconheceu provisoriamente, não apenas o esporte, mas também a International Cheerleading Union (ICU). O reconhecimento do Comitê é um dos primeiros passos para que qualquer modalidade possa se tornar um esporte olímpico.
Apesar de todas essas conquistas, o cheer, como popularmente é chamado o esporte, ainda sofre estigmatização. Muitas vezes, a visão sobre o esporte é sexista, tido como uma “prática de mulher”. Contrariando o pensamento comum, o cheerleading nasceu em 1887 na Universidade de Princeton, e, no início, era praticado apenas por homens. Com o tempo, mulheres foram aceitas e passaram a participar também, sendo hoje em dia a maioria dos atletas. A modalidade chegou ao Brasil em 2008, aproximadamente 120 anos depois de sua criação, pela Comissão Paulista de Cheerleading.
No esporte existem subdivisões por gênero: aqueles times formados tanto por homens quanto mulheres são classificados como “coed”; os que têm apenas homens são chamados de “all boy”; enquanto os que possuem apenas atletas mulheres são chamados de “all girl”. Além disso, também possuem diferenças quanto à classificação geral. De uma forma mais básica, equipes universitárias precisam que seus membros tenham vínculo com as instituições de ensino, enquanto as equipes all star possuem como atletas participantes de ginásios voltados ao cheer.
Nayara, 28 anos, conheceu o cheerleading em 2012. “Eu fazia ginástica rítmica antes e um treinador da época, o Pedro Campelo, estava procurando por atletas ou ex-atletas para formar uma equipe de cheer. E uma amiga minha foi convidada e ela me chamou. Falou: ‘Ah, Nay, você vai gostar, você gosta de coisas diferentes assim’. Aí eu fui a um treino na praia e amei”.
Diferente da história da maioria, Nayara não começou no cheer em um time universitário, mas sim na categoria acima: all star. Entretanto, ela foi uma das fundadoras do time “Minervas”, o all girl geral da UFRJ, em 2015.
Nayara também foi uma das primeiras integrantes do Team Brazil, a equipe oficial formada por atletas de todo o Brasil, chegando a competir na categoria coed de 2015 a 2017, até chegar a posição de head coach do Team Brazil all girl. Durante sua carreira como atleta, notou a dificuldade que era praticar o esporte de forma segura sem um lugar com infraestrutura adequada. Por isso, decidiu abrir seu próprio ginásio de cheerleading, o Arkhaios, no bairro Grajaú, no Rio de Janeiro.
Depois de 10 anos como atleta da modalidade, Nayara busca incentivar as pessoas que querem praticar o cheerleading, mas que por algum motivo, ainda não deram o pontapé inicial.
ABC do cheerleading
O cheerleading é um esporte que exige força, flexibilidade, resistência e agilidade. Isso porque, para conseguir criar uma rotina, são necessários elementos cruciais como: stunts, pirâmides, tumbling, jumps e dança, que serão apresentadas em 2min30s ao som do cheermix de cada equipe. Além disso, antes da rotina começar, é necessário apresentar a “cheer session” durante 30s.
Stunts e pirâmides: Um stunt é a parte da rotina em que são feitas as elevações e são formados pelos atletas base, que são responsáveis pela sustentação da flyer que, por sua vez, é a atleta que está sendo elevada. No geral, a flyer performa alguma figura em cima do stunt.
Atleta performa os movimentos “heel” e “lib”, respectivamente em apresentação do Team Brazil All Girl, no Mundial de Cheerleading / Foto: Arquivo pessoal
As bases de um stunt podem ser caracterizadas como traseiras – também conhecida como backspot – que ficam, no geral, atrás da flyer, frontais (frontspot) e laterais. Dentro das bases laterais também há uma subdivisão: a base central, caracterizada por ser geralmente a lateral mais baixa, que dita a altura do stunt. Um stunt não precisa ter necessariamente quatro bases, podendo ser uma base tripla, dupla ou única – nesse caso, passa a ser chamado de partner.
Uma pirâmide é a junção de dois ou mais stunts por um elo feito pelas flyers, que devem estar conectadas umas às outras.
Tumbling: Considerada uma das performances mais difíceis, o tumbling é a parte das acrobacias, que veio da ginástica. Estrelinha, rolinho, reversão e rondada são alguns exemplos de tumbling de nível 1.
Jumps: Como o próprio nome já diz, são os saltos que os atletas dão e, geralmente, precisam executar alguma figura no ar.
Dança: A dança do cheerleading não é o que chamamos de “dança fluida”, mas sim uma coreografia meio robotizada com movimentos precisos e bem marcados, como quase tudo nesse esporte.
Cheermix: É o nome dado à música que acompanha a rotina. Como o nome indica, é uma mistura musical com a adição de efeitos sonoros colocados em momentos estratégicos, de acordo com o desempenho de cada profissional.
Cheer session: Traduzindo para “sessão de torcida” com o objetivo de mostrar o “grito de guerra” e, de fato, exibir como o time torceria em prol de outro. É a parte que mais se assemelha ao que seria um sideline show dos filmes americanos, em que são usadas placas, pompons e cones.
Preconceitos e dificuldades no cheerleading brasileiro
Os atletas reclamam da dificuldade de encontrar ginásios de cheerleading para aprender o esporte que ainda enfrenta preconceitos de gênero.
Carlos, de 31 anos, conheceu o cheerleading também no meio universitário. Ele participou do time geral do CEFET/Maracanã e em 2017 entrou para a equipe all star da Trinity e, em 2018, para o Arkahios, no qual segue até hoje em duas equipes de nível 3. Carlos explica que, apesar de ter grande apoio da família, o mundo fora dessa bolha não é tão receptível a esse esporte.
Além disso, o cheer também não é um esporte acessível a todos. Carlos relata que, principalmente, a partir do meio do ano, quando se dá início à temporada de competições no Brasil, começam as maiores despesas: pagamento do cheermix, uniforme, inscrição nas competições, que, por atleta, costumam passar dos 100 reais. Isso tudo, somado às mensalidades dos ginásios e as aulas extra específicas para alguma habilidade, acaba encarecendo a prática de cheerleading.
“Esses são apenas os custos diretos, mas há também custos indiretos como locomoção, alimentação. Me lembro que em 2016 eu não trabalhava e, para me manter no cheer, em vez de gastar cerca de 25 reais almoçando, eu comia um lanche qualquer pra usar o dinheiro do almoço para pagar os custos do esporte. Fora as apresentações em sinais de trânsito que eu fazia com o time universitário para conseguir competir. Tudo isso pesa no psicológico tanto quanto o esporte pesa no bolso, mas quem é atleta sabe que para evoluir e ser bom, esses são só alguns dos obstáculos.”, Carlos declara.
Entretanto, com sorte, os dias de pouco reconhecimento podem estar contados. Nas Olimpíadas de 2028, que serão sediadas em Los Angeles, EUA, há a expectativa de que o cheer finalmente vire um esporte olímpico. Contudo, essa não é a única modalidade que está nessa disputa. Críquete, lacrosse e flag football são exemplos de modalidades que também esperam ansiosamente o anúncio de qual será o próximo possível esporte olímpico.